Atravessamos uma época de contradições. Se, por um lado, sentimos constantemente falta de um recurso tão precioso como o tempo, por outro, também vivemos numa certa arrogância que se traduz na forma como o gerimos. A verdade é esta: consideramos garantido este recurso finito.
O hábito de deixar para “um dia”…
Damo-nos ao luxo de adiar aquele almoço, aquele jantar, aquele café, aquela visita, aquele abraço… Porque temos sempre dezenas de coisas para fazer e acabamos por relegar esses momentos para o habitual “um dia”, sabendo de antemão que esse dia nunca chega. Agora, que obrigatoriamente nos vemos forçados a recolher, ganhamos consciência que o tempo será o recurso mais abundante nas próximas semanas sem que, no entanto, tenhamos liberdade para o gerir. Tanto tempo para almoços e jantares que não podemos organizar… Tanto tempo para abraços que não vamos poder dar.
Tudo o que era garantido até há uns dias está, neste momento, seriamente comprometido. As rotinas diárias como a escola e o trabalho, a ida ao café, ao supermercado, à praia, ao cinema ou ao ginásio. É impossível não nos sentirmos impotentes num cenário onde não passamos de meros espectadores.
A ironia do slow living
Não deixa de ser irónico que a causa deste slow living inesperado (que tantas vezes tentamos alcançar através de actividades saudáveis como o yoga ou a meditação) seja um vírus à escala global: COVID-19. Não estávamos preparados para abrandar subitamente e, agora, vamos ter de aprender depressa a viver devagar.
É fundamental termos a mente aberta para os desafios que aí vêm e precisamos de ser criativos na gestão do nosso [excesso] de tempo. Por isso mesmo, em vez de desesperar, o melhor é aproveitar. Vejam aqueles filmes e séries que queriam ver, leiam aquele livro que há tanto tempo querem ler. Tirem o pó à máquina de costura ou às agulhas de tricot, experimentem receitas novas, recuperem os jogos em família… Não vai ser sempre fácil mas podemos melhorar aquilo que não conseguimos mudar.
Façamos este retiro com força de espírito e ânimo no coração. Abracem este momento com optimismo e com a confiança de que nos piores momentos podem surgir as melhores ideias. Nunca a humanidade teve tempo para parar em simultâneo. O Mundo está ligado através de uma pandemia. Aproveitem para (se) ligarem às vossas pessoas, oferecendo-lhes o vosso tempo.
Agora não há desculpas.
Agora é o momento.